A promoção da prática desportiva de crianças e jovens

A promoção da prática desportiva de crianças e jovens. Um olhar para além do óbvio

A promoção da prática desportiva entre crianças e jovens é um objetivo consensual, considerando os seus vastos benefícios para a saúde (física, mental e social). Contudo, aumentar os níveis de participação desportiva regular é um desafio, que muitas vezes é abordado com estratégias que não captam toda a complexidade do fenómeno. Neste contexto, a Teoria Ator-Rede (TAR) surge como uma abordagem analítica poderosa, convidando-nos a olhar para além dos intervenientes humanos óbvios e a considerar a intrincada teia de relações que molda o processo de participação desportiva das crianças e jovens.

O que diz a Teoria Ator-Rede?

A ideia principal da TAR é que a realidade social é construída através de "redes" de relações que estão sempre a mudar.

Estas redes não são compostas apenas por humanos. A TAR introduz o conceito de "atores", que podem ser qualquer entidade – humana ou não humana – capaz de influenciar a ação dentro da rede. Isto inclui não só as crianças, pais, treinadores ou decisores políticos, mas também elementos como equipamentos desportivos, instalações, regulamentos, tecnologias e até conceitos abstratos como "saúde" ou "divertimento". Até o telemóvel é um “ator não-humano”, capaz de influenciar a ação, ou seja, a participação desportiva das crianças e jovens.

As dinâmicas da rede são moldadas por processos de "tradução" (como os atores alinham interesses) e "mediação" (o papel dos intermediários na facilitação das interações).

A complexidade da rede do desporto juvenil

Aplicando a TAR ao desporto juvenil, identificamos uma rede complexa e multifacetada:

Atores humanos: Crianças/Jovens (com as suas motivações e divertimento), Pais/Famílias (apoio, recursos, constrangimentos), Treinadores/Técnicos (filosofia, relação pedagógica), Professores/Escolas (currículo, infraestruturas), Decisores Políticos (financiamento, regulamentação), Clubes/Organizações (oportunidades estruturadas), Media/Influenciadores (moldam perceções).

Atores não humanos: Equipamentos (acessibilidade, design), Instalações/Infraestruturas (qualidade, acesso), Espaços Escolares (utilização), Políticas/Regulamentos (apoio ou barreira), Conteúdos Mediáticos (narrativas), Conceitos como "Saúde"/"Bem-estar" (influenciam políticas e motivações).

Interações e a agência dos não humanos

A TAR realça que a participação não depende apenas da vontade individual ou do apoio parental. É o resultado da interação constante nesta rede. O prazer da criança (ator humano) interage com a disponibilidade de um campo de jogos seguro (ator não humano), o incentivo do treinador ou professor de educação física (ator humano) e com as narrativas dos influenciadores digitais (ator não humano). O custo do equipamento (ator não humano) pode ser uma barreira tão significativa quanto a falta de tempo dos pais (ator humano). As regras de um desporto (ator não humano) podem ser mais ou menos apelativas e inclusivas para diferentes faixas etárias.

Reconhecer a "agência" – a capacidade de influenciar – dos atores não humanos é fundamental para a criação de estratégias adequadas de promoção da prática desportiva.

O que fazer na prática?

Esta perspetiva sugere que intervenções isoladas (focadas apenas na criança, na escola ou no clube, por exemplo) são insuficientes.

Para fomentar a prática desportiva juvenil, é necessária uma abordagem holística que considere toda a rede:

  1. Tornar o Desporto mais fácil e mais barato: reduzir os custos de equipamentos e mensalidades, e garantir o acesso facilitado a bons locais para a prática desportiva.
  2. Criar ambientes positivos: focar na diversão, na aprendizagem e em fazer com que todos se sintam bem-vindos, em vez do foco ser na competição, especialmente nos escalões mais jovens.
  3. Usar as “coisas” a nosso favor: melhorar os campos e os materiais, adaptar as regras dos jogos para serem mais divertidos e adequados a cada idade, promover narrativas digitais influenciadoras da prática desportiva.
  4. Fomentar a colaboração: reforçar as ligações entre escolas, clubes, famílias, autarquias e outros atores para criar um ecossistema de apoio coeso.

A Teoria Ator-Rede oferece um quadro conceptual enriquecedor para o desenvolvimento de estratégias mais adequadas às complexas dinâmicas da participação desportiva juvenil. Ao mapear e analisar as ligações e influência mútua entre todos os atores – humanos e não humanos – podemos desenvolver estratégias mais informadas, integradas e, potencialmente, mais eficazes e equitativas para promover um futuro ativo e saudável para as nossas crianças e jovens.